• sábado, 12 de setembro de 2020



    Os raios de sol começavam a adentrar o cômodo escuro e conforme a luz invadia o espaço um jovem garoto de cabelos negros se remexia na cama. Ao perceber que o dia já começava, o rapaz resmungava pois não queria levantar tão cedo, ainda se sentia cansado de mais uma noite que passava em claro. Puxou as cobertas para seu rosto e virou para o outro lado fechando os olhos com força decidido a dormir nem que fosse apenas mais uma ou duas horas.

    Sua breve tentativa de se esconder do mundo cheio de seus problemas logo foi interrompida pelo som de batidas rápidas e ritmadas na porta, quem poderia chamar por ele tão cedo? Só conseguia pensar em uma possibilidade, a garota que conhecera a alguns dias e que seria a única pessoa que conhecia a acordar tão cedo sem alguma razão aparente.

    Sentou-se na cama e olhou ao seu redor. O quarto era bem simples. Possuía uma cama, um sofá ao lado e uma mini cozinha, tudo no mesmo espaço. O sofá acomodava as coisas dispersas do garoto com sua mochila entreaberta ( inclusive com alguns pertences caídos em seu entorno ) jogada em um canto e seu celular na cabeceira da cama indicava que ainda não passava das oito da manhã. Noutro canto daquela sala um grande pássaro dormia em um ninho improvisado com algumas almofadas tendo debaixo de suas asas duas criaturinhas menores, um Darumaka e um Axew, que repousavam tranquilos.


    O garoto se levantou lentamente e caminhou até a porta. Seus cabelos geralmente presos estavam soltos e passavam um pouco do ombro, algumas mechas rebeldes caiam entre seus olhos, mas ele não se importava com isso, muito menos com seu pijama preto e folgado todo amassado.

    Girou a maçaneta e para sua surpresa quem estava lá não era Kai mas sim Haru. A garota que conhecera no dia anterior se encontrava parada frente a porta e vestia uma jaqueta preta aberta por cima duma camisa cinza. Calça jeans em um tom azul escuro junto de um par de tênis com detalhes vermelhos completavam seu visual. Ela o olhava séria. Era estranho estar tão próximo dela, sentia-se de frente para uma grande pira, e que se cometesse o erro de se aproximar demais queimar-se se tornaria inevitável.

    Ela o encarou de cima a baixo julgando seu estado recém acordado.

    — Posso ajudar em algo? – Oliver perguntou seguindo sua frase de um bocejo.

    — Não vai me convidar pra entrar? — perguntou.

    — Eu preciso mesmo? – olhou desanimado. Algo dizia para si que aquela garota era um ímã de problemas.

    Ela continuava o encarando ignorando seu protesto e aquilo começava a lhe irritar.

    — Ah, dane-se, acaba logo com isso, entra logo vai. – ele se afastou para o lado, abrindo passagem para ela.

    — Obrigada. – ela passou por ele com passos firmes. Parecia o julgar pela maneira que ele simplesmente jogara suas coisas, caminhou até o sofá sentando-se ao lado da mochila jogada e encarando o rapaz.

    — Eu não tentaria fazer nenhuma gracinha se fosse você. – o garoto apontou para ela em seguida para os pokémon que acordaram com a conversa e agora olhavam com olhares curiosos para a inesperada visita.

    — O que você vai mandar eles fazerem? Chorar em mim? — Ela sorria, achava engraçado como ele desconfiava dela. — Relaxa que se eu fosse te roubar entraria por essa janela aberta em vez de bater na sua porta.

    Oliver se irritava com a ousadia dela, mas não tinha como tentar rebater o argumento. Se conformou um pouco com a situação.

    — Eu quero sua ajuda dentro do navio. – disse sem rodeios, o encarando séria.

    — Você não ia dar um jeito nisso? – ele se sentia cansado só de imaginar o que ela queria dizer com aquilo.

    — Eu já dei meu jeito, embarcar vai ser moleza. – falava com confiança em seu plano.

    — Como é o seu jeito?

    — Isso é segredo, não posso revelar todos os meus truques. – disse entre um sorriso, levando o indicador a boca fazendo um sinal de silêncio. – Entrar vai ser fácil, mas eu preciso de um lugar pra conseguir guardar minhas coisas e passar um tempo enquanto o navio ainda não zarpou. Ficar andando por lá com minha mochila chamaria muita atenção, alguém pode suspeitar.

    Ela não estava errada. Se sua figura já era chamativa em uma cidade dentro de um navio seria ainda mais. Oliver nem pensou direito na ideia e logo se decidiu de sua resposta.

    — Não, obrigado.

    Curiosamente a expressão dela não se alterou. Pelo contrário, parecia prever por uma resposta como essa e já ter vindo preparada para aquilo.

    — Eu não esperava que você aceitaria de cara, então trouxe uma oferta mais atrativa para você. – de um dos bolsos internos de sua jaqueta ela puxou um aparelho vermelho que se assemelhava a uma agenda com vários botões e alguns leds, uma Pokédex.

    — Eu tenho uma dessas sobrando, modelo de última geração, muito útil pra qualquer treinador. Se você quiser pode ser sua caso me ajude.

    Ela balançava o objeto como alguém balança uma bolinha para um Growlithe pidão. 

    — Olha, eu não tenho interesse em batalhas ou treinar pokémons, eu realmente não teria o que fazer com isso. – a voz do garoto agora passava mais sinceridade do que o habitual desânimo, até certo arrependimento.

    Por um momento ela não soube o que responder, sua oferta era tão boa que ela nem pensara na possibilidade de ele negar.

    — Bem, você pode dar pra alguém que se interessar por isso, ou pode vender, "cê" que sabe. – ela se levantou do sofá, andando em direção a porta e levando o objeto consigo. – Pensa na oferta e me responde até hoje a noite.

    E da mesma forma que chegara ela saiu, deixando o garoto se perguntando o que fora aquilo e como ele conseguia atrair tanta gente louca para perto de si.

    Após algum tempo da saída dela o rapaz voltou para cama de onde não gostaria de ter saído jurando pra si mesmo que teria só mais cinco minutinhos de sono sem ser atrapalhado por alguém.

    Se levantou com um pulo, sentia o suor escorrendo pela sua face. Seu coração palpitava freneticamente e parecia querer sair pela boca. Olhou para os lados em busca de algo, seus preciosos amigos ainda estavam ali. Eles estão bem, foi só um pesadelo, nada aconteceu com seus pokémon. Não conseguiu evitar um suspiro aliviado.

    Sentou na cama, sua respiração ainda estava ofegante, malditos pesadelos que continuavam voltando, sempre o mesmo sonho.

    Os três pokémon que estavam em um dos cantos do quarto se aproximam dele. Bravi e Daru pareciam preocupados porém já acostumados com o ocorrido, já Axew tinha seus olhos cheios de preocupação, olhava triste e ameaçava cair no choro.

    Segurou o menor em seus braços o confortando e dizendo que não precisava se preocupar.

    — Eu tô bem pessoal, podem ficar tranquilos. – afagou com a mão livre seus outros dois companheiros enquanto forçava um sorriso.

    "Que horas são?", um breve pensamento passa por sua cabeça. Procurou pelo Xtransceiver em busca da informação e o achou jogada próximo a si. “ONZE HORAS?!” Eram pra ser só cinco minutos mas foram três horas, já devia ter perdido o café oferecido pelos centros, uma lástima.

    Ficou ali por um tempo brincando com seus companheiros enquanto mexia no aparelho. Atualizou sua timeline sem prestar muita atenção no que postaram, não se importava muito mesmo. Até que algo o chamou a atenção, algumas mensagens não lidas, recentes. Era incomum… Há quanto tempo alguém não lhe mandava uma mensagem? Suas mães sempre ligam quando precisam falar algo importante, então quem poderia ser?

    Abriu o Chat-Ot, um aplicativo de mensagens de texto bem popular entre a maior parte da população. O contato salvo simplesmente como "Kai" ao lado de uma foto da garota de cabelos cinzas sentada em um galho de uma árvore alta apareceu em destaque indicando que ela era a última pessoa a lhe enviar algo.


    — Ei dorminhoco, tá aí?

    — A "gnt" bateu na porta mas "vc" não respondeu.

    — As meninas nos chamaram pra ir ver um museu lá no centro. TEM FÓSSEIS EM EXPOSIÇÃO.

    — Se você ver isso logo ainda dá pra

    nos encontrar no refeitório.


    As mensagens tinham mais de duas horas. "COMO EU TENHO UM SONO TÃO PESADO E NÃO OUVI NEM AS BATIDAS E NEM AS MENSAGENS?" se questionou irritado consigo mesmo.

    Agora não importava mais, já era muito tarde para acompanhar elas em sua jornada por um museu.

    Finalmente se levantou da cama. Em uns trinta minutos tomou um bom banho, escovou seus dentes e pegou uma roupa que não estivesse amassada. Retornou seus pokémon para as devidas pokéballs, exceto o pequenino Axew, que se recusou a entrar preferindo acompanhar de fora apoiado nos ombros do garoto. Por fim saiu do Centro Pokemon.

    A cidade já começava a se movimentar e ele se sentia perdido, conhecia alguns lugares que vira ontem e poderia almoçar, mas não sabia ao certo como fizera pra chegar lá, as vezes se arrependia de não prestar tanta atenção nas coisas ao seu redor, sentia que a vida passava diante dos seus olhos enquanto assitia sem reagir.

    Decidiu seguir pela avenida principal. Ele estava com fome mas não conseguia tirar da cabeça a conversa que tivera com Haru. Era tudo suspeito demais... Pokédex são itens raros, nem todo mundo consegue adquirir uma, quem é louca a andar com duas por aí? E ainda tentou lhe comprar com isso, alguém que sonha em ser treinador aceitaria na hora, mas esse não era ele, não estava tentado pelo objeto, ao menos não por ele em si, mas a ideia de poder o entregar para alguém sim lhe tentava. Entregar para Kai. Gostaria de agradecê-la por ter aceitado o convite e por ajudar a encontrar seu Braviary. Aquela podia ser uma boa oportunidade para ficarem quites. Mas esses pensamentos o deixavam confuso, não conseguia confiar na garota de cabelos vermelhos que lhe ofertara o item.

    Enquanto se questionava teve a impressão de ouvir uma voz. Era como um zumbido de um inseto irritante que continuava a lhe perturbar e parecia chamar seu nome. Virou-se para trás e avistou um garoto de cabelos loiros escorridos e bem arrumados, como se um Tauros tivesse passado um bom tempo apenas os lambendo vigorosamente.

    — OLIVER JONES, EU TE DESAFIO PARA UM DUELO POKEMON! – o garoto gritou apontando para ele e chamando atenção de todos na rua.

    Ollie teve a leve impressão de já telo visto antes, mas nada veio em sua mente portanto concluiu que se não lembrava não devia ser alguém importante. O Axew em seus ombros inicialmente se assustara mas agora grunhia em direção ao intrometido.

    — Não, eu passo. – e seguiu a andar como se nada tivesse acontecido.

    — EI, VOCÊ NÃO PODE NEGAR UMA BATALHA COM SEU RIVAL! – protestou o seguindo com passos rápidos.

    — Eu nem sei quem é você. — não parecia mentir ao dizer essa frase.

    — COMO NÃO? EU SOU O FÉLIX, SEU RIVAL! NÓS BATALHAMOS ONTEM, EU QUERO UMA REVANCHE. – o loiro já se irritava com toda aquela situação. — EU TENHO UM NOVO POKÉMON, VOCÊ NÃO PODE ME DERROTAR!

    Oliver parou por um momento e pensou. Tinha uma vaga memória de ter batalhado contra um treinador que usara um Honchkrow, mas nem se importara de perguntar seu nome.

    — Ah, era você. É tanta gente barulhenta que eu me confundo. – aquela conversa o cansava tanto, só queria achar um lugar para almoçar em paz.

    Oliver seguiu andando desejando que Félix parasse de o seguir, mas para seu azar isso não aconteceu. Por isso decidiu que a melhor coisa a se fazer seria apenas ignorar e seguir a vida. Andou por alguns minutos sendo seguido pelo garoto que continuava a tagarelar sobre coisas como a importância de aceitar os desafios oferecidos pela vida em vez de fugir deles e outras coisas mais, nada que importasse muito.

    Os dois chegaram até um restaurante no canto de uma esquina. Haviam algumas mesas na calçada e a porta de vidro possuía uma plaquinha que indicava que o estabelecimento estava aberto.

    Adentraram o local, e logo se depararam com mesas de madeira, as quais davam um ar tranquilo para o espaço. Não haviam muitas pessoas, o único que comia ali era um homem sentado em uma das cadeiras mais ao canto. Sua presença chamava certa atenção, tanto por ser alto, como por possuir uma grande cicatriz que cortava desde a bochecha até acima do nariz. Suas feições eram fortes e marcadas, ele não chegava a ser velho mas certamente o tempo não foi gentil com o pobre Lycanroc do mar, devia ter por volta dos trinta anos mas aparentava um pouco mais. 


    Seus cabelos negros eram escondidos por uma boina de marinheiro com a representação de uma ave no centro, usava camisa social avermelhada e um sobretudo preto por cima, sua calça era da mesma cor. Comia um grande pedaço de carne despreocupadamente vez ou outra dando uma longa tragada em um cigarro. Nenhum dos funcionários tivera coragem de pedir para que parasse com o ato mesmo havendo uma pequena placa indicando "Proibido Fumar" na parede ao lado. Como não haviam outros clientes acharam melhor evitar algum problema.

    O homem ao perceber a entrada dos dois no estabelecimento esboçou uma expressão de surpresa e fez um sinal para que eles se aproximassem, mesmo que Oliver reclamasse da presença indesejada de seu autoproclamado rival o acompanhando.

    O garoto caminhou até ele e puxou uma cadeira para se sentar.

    — E aí tio. – Oliver fez um aceno com a mão despreocupadamente.

    O homem terminou de mastigar um pedaço que já estava em sua boca e começou a falar irritado.

    — Ei, moleque maldito! Já disse que não sou seu tio, não faça eu me sentir mais velho do que já sou. — reclamava entre mordidas.

    — Certo, certo tio. – ignorou completamente o pedido e prosseguiu. – Que cê tá fazendo aqui? Meio raro te ver fora do navio.

    — Eu tenho uma vida fora de lá, sabia? – os dois se provocavam mas não pareciam verdadeiramente irritados, aquele era apenas o modo que sua relação acontecia.

    — Desde quando? Você é casado com aquela coisa, quando foi a última vez que você conversou com alguém de fora da tripulação?

    Enquanto os dois conversavam o loiro fizera um aceno para um dos garçons. Um garoto jovem de cabelo curto e um topetinho apareceu, devia ser novo no emprego pois tremia um pouco. Em sua roupa um pequeno crachá indicava seu nome, "Marcelo".

    — Bom dia nobre garçom, gostaria de algo leve para minha refeição, me traga sua melhor salada acompanhada de uma boa taça de vinho Kalosiano, não quero essas coisinhas meia boca que vocês servem para todos, encaminhe o pedido ao chefe.

    O garoto anotou o pedido um pouco desengonçado em um caderninho e olhou para Oliver.

    — Traz o prato do dia e um copo de refri pra mim, meu chefe. – pediu rapidamente e logo voltou-se para sua conversa.

    O rapaz confirmou os pedidos e saiu em direção a cozinha com passos rápidos.

    — Você não tá muito ousadinho não? E pra sua informação, eu conheci uma mulher linda. – o capitão John por um momento perdeu-se em seus pensamentos enquanto dava uma longa tragada em seu cigarro.

    — Me diz que ela não é uma ruiva alta... – olhava esperando uma resposta

    — Quê? Tá louco moleque. – fez uma pausa enquanto se ajeitava na cadeira, parecia querer contar aquilo para alguém a um certo tempo e apenas esperava o primeiro desavisado a lhe perguntar sobre sua vida amorosa. – Eu conheci ela tem alguns meses, numa das pausas em Torom aconteceu uma queda de energia e isso atrasou nossa partida, e .... 

    Durante alguns bons minutos o homem devaneou lembrando o dia em que a conhecera. Sobre o quão belos e sedosos eram seus longos cabelos cinzas, e de como ela tinha um agradável aroma de mel. Reiterou essas informações mais de uma vez enquanto sorria meio bobo.

    Nesse meio tempo o garçom já voltara com os pedidos, uma vistosa salada com frutas e folhas nativas para Félix e uma taça de vinho, e alguma espécie de peixe frito para Oliver acompanhada por um refrigerante alaranjado, os dois pratos cheiravam muito bem.

    — Você realmente andou mudando hein, tio? – o jovem não conseguiu conter um sorriso de canto, estava feliz por ele. – Quem diria que aquele velho carrancudo estaria por aí todo apaixonado.

    — Só eu? E você, seu puto! – o homem apontou em direção ao jovem que mastigava. – o que você tá fazendo por aqui mesmo? Sair do meu navio é uma novidade, você ficava vagando por lá como se fosse uma assombração. Agora tá aqui cheio de gracinhas, tem até um amigo.

    — Nós não somos amigos, somos…

    — RIVAIS! – Félix falou abruptamente enquanto ainda tinha comida na boca, o que por sua vez o fez começar a engasgar com os restos. – Eu tô bem…

    "Rivais". Há quanto tempo  não ouvia alguém dizer isso tão entusiasmado? Breves memórias de sua juventude retornaram, bons tempos em que era apenas um garotinho sonhando em sair em jornada com seus bons companheiros, tempos que não voltariam mais. Mas precisava voltar a si.

    — Não liga pro que ele tá dizendo, só resolvi mudar algumas coisas. Alguns imprevisto me fizeram conhecer algumas pessoas.

    — Eu ia falar sobre esse Axew aí. – apontou para o dragão sorrindo. – Não era você que tinha desistido da vida de treinador?

    — Foi apenas uma exceção, ele estava sozinho...não podia deixar lá... – falou meio relutante.

    — Certo, certo. Não quer falar eu não pergunto, mas deixando isso de lado, e então? – a expressão do homem mudara e ficara mais rígida, parecia prestes a falar sobre algo mais sério. – Finalmente decidiu tomar coragem e ir vê-las? Você sabe que elas sentem sua falta.

    O garoto abaixou a cabeça, pensativo, talvez até meio envergonhado de admitir algo do qual viera fugindo há um bom tempo.

    — Acho que sim. Mas não sei se elas vão ficar felizes em me ve…

    Antes que ele terminasse sua frase sentiu a lateral da mão do homem acertando sua cabeça numa alta velocidade. Não bateu forte o suficiente para machucar, era apenas um gesto para que ele parasse de falar, como se repreendesse uma criança que tentava pegar um doce escondido.

    — Ei, por que fez isso? Eu não sou mais criança. – protestou levando a própria mão a cabeça.

    — Então pare de agir como uma. – o encarava nos olhos. Não estava bravo, porém era fácil confundir, suas orbes azuis pareciam ver até a alma do pobre rapaz. – Você não pode reclamar do que acontece na sua vida e continuar  ignorando a necessidade de se adaptar a realidade.

    Passado alguns segundos de um silêncio constrangedor o homem fez um gesto e chamou o garçom, já havia terminado sua refeição.

    — Eu preciso resolver algumas coisas. Casos de piratas roubando navios tem aumentado esses dias e por isso terei que sair, mas obrigado pela companhia. – John sorriu, estava feliz de passar um tempo com Oliver. O garoto era filho de sua melhor amiga e como um sobrinho para ele, e por tal era bom vê-lo saindo e conhecendo gente nova.

    O trêmulo rapazote correu até a mesa entregando uma anotação com a conta dos pedidos.

    John entregou uma nota com um Moltres estampando o verso para o atendente boquiaberto e se levantou.

    — Vai servir pela minha comida e desses dois aí. – apontou para os dois jovens que ainda terminavam suas refeições. – Pode ficar com o que sobrar como gorjeta.

    E caminhou até a porta, mas parou pouco antes de sair, virando-se para Oliver.

    — Ei moleque, quando ver elas, dê um abraço na Sarah por mim.

    — PODE DEIXAR!

    ...


    As sombras da noite começavam a cair. Conforme as horas avançavam as pessoas voltavam de seus trabalhos e as luzes das casas e postes passavam a iluminar a cidade. Caminhando por uma rua estava o garoto de cabelos negros acompanhando somente de seu Axew. Conseguira dar um perdido em Félix enquanto o loiro se envolvera em uma batalha tentando se exibir, o que gerou a oportunidade perfeita para que saísse de fininho.

    Mas estando sozinho se sentia como uma Magikarp fora d'água, estava totalmente deslocado do local e das pessoas com seus destinos já decorados.

    As palavras de John ressoaram em sua mente e o incomodavam enquanto andava. Deveria deixar de fugir das coisas? Evitar encarar um problema de frente era bem mais fácil do que tomar alguma atitude, mas podia levar a arrependimentos irreparáveis, e ele sabia disso. Mas como abandonar velhos hábitos? Como largar essa vontade incessante em seu peito de jogar tudo pro alto e fugir pra longe de todos? Não sabia a resposta para aquelas perguntas, mas sabia que não podia manter aquilo pra sempre, precisava tomar decisões ativamente.

    — O que de pior pode acontecer em ajudar aquela doida? – murmurou baixinhos olhando para cima pedindo a opinião do Axew em sua cabeça.

    O dragão se agarrou em seu rosto e olhou em seus olhos sorrindo e balançando a cabeça alegremente para ele. Mesmo que sua pergunta não tivesse sido de sim ou não decidiu tomar aquilo como um sinal positivo. Poderia pedir para seu tio tentar arranjar uma entrada para Haru, que lhe fez um pedido encabulador mais cedo neste dia, mas a sua curiosidade de vê-la possivelmente fracassando em conseguir entrada falava bem mais alto. No pior dos casos, como um em que ela fosse pega no navio, ele poderia intervir. Mas não antes de se divertir um pouco com a cena.

    Não era uma grande decisão, mas era um começo. Eram pequenas decisões como essa que ele poderia ir tomando ao longo do tempo, construindo coragem para enfrentar as consequências dos atos de que se envergonhava.

    — PEGA ELE! – uma voz feminina foi ouvida, gritando alto o comando em suas costas.

    O pobre garoto nem teve tempo de reagir, enquanto se virava para trás tudo o que vira foi um grande vulto vermelho correndo em sua direção e pulando em suas costas, o jogando no chão com muita facilidade e permanecendo em cima dele.

    Então vieram risadas. Não de uma única pessoa, mas sim de várias. Parecia ser um grupo que se aproximava com passos rápidos e eufóricos. O garoto tentava levar a mão até suas pokeballs, mas seus braços estavam presos contra o chão. Também não conseguia alcançar o colar em seu pescoço, muito menos o cinto. Que droga estava acontecendo? Ladrões? Uma gangue?

    — Ei, eu acho que ele morreu, não tá se mexendo... – outra voz feminina fora ouvida.

    — A GENTE MATOU ELE?! – uma terceira voz.

    — Morreu nada, deve ter dormido aí mesmo. – uma quarta voz se fez ouvir, uma que ele conhecia muito bem.

    — KAI?! – gritou tentando se levantar e falhando novamente.

    — Viu só? Tá forte como um Tauros. – a voz que agora o garoto tinha certeza ser de Kai falou seguida por uma risada. 

    — Kiara, levanta! – a pessoa que ordenara o primeiro comando disse alto.

    Oliver sentiu o peso ser retirado de suas costas, conseguindo se sentar na calçada e entender o que acontecera ali. Seu Axew que estivera preso entre ele e o vulto ameaçava chorar pelo susto, mas tentava se conter nos braços do garoto.

    Finalmente, conseguiu olhar quem estava ali. Caminhando juntas estavam Kai, Ayla, Rafaella e Haru. O quarteto era acompanhado por uma grande Arcanine, agora sentada alegremente próxima a elas após sua brincadeira de "pega".

    O rapaz piscou pensando ter visto errado, mas forçando um pouco sua visão confirmou algo curioso. Kai e Ayla usavam em uma espécie de grande moletom que simulavam a aparência de pokemons. O de Kai emulava um Tyrantrum, já o de Ayla um Aurorus.

    — Pelo amor de Arceus, vocês querem me matar do coração? – ele falava irritado, embora não conseguisse manter por muito tempo essa irritação por estar aliviado demais em não ser morto por uma gangue de pessoas vestidas de dinossauro. Seria ridículo demais.

    — Foi só uma brincadeirinha, a Kiara só queria dizer oi. – Haru justificava tentando conter o riso. – A gente te viu passando cabisbaixo e resolvemos te animar.

    — Vocês tem um senso de humor duvidoso... E de moda também. – Oliver disse encarando aquelas roupas se perguntando como alguém olhara para aquilo e pensara ser uma boa ideia.


    — EI, MEU MOLETOM É LINDO! É UM TYRANTRUM! – Kai dizia em protesto, colocando o capuz e sendo apoiada por Ayla.

    Haru e Rafaella mantinham-se a certa distância, elas também não eram grandes fãs daquelas roupas chamativas. E agora o grupo chamava ainda mais atenção das pessoas que passavam nas ruas, porque eles não conseguiam se reunir por um minuto sem criar confusão.

    — Mas se você não gostou das nossas roupas não vai gostar disso também... – Kai disse puxando de um bolso o que se assemelhava a um grande e longo dente com algumas marcas preso a um cordão.

    — Ei...eu não disse isso. Você lembrou de mim? Eu quero. – o garoto abaixara o tom enquanto se levantava do chão.

    — Não! Gastei meu precioso tempo e dinheiro pra comprar esse dente de Tyrantrum e você me trata assim, criticando minhas roupas e gostos? Não, não vou dar! – disse enquanto cruzava os braços.

    — Ela não tinha achado essa presa jogada em um banco? – Haru perguntou vendo a cena e sendo acertada por uma cotovelada rápida de Rafaella.

    — Mas porque ficar se prendendo ao passado, né? Devemos olhar pra frente, pro futuro! Quem se importa com o que passou, pessoal? – Kai rapidamente buscou mudar o assunto enquanto entregava o pontiagudo objeto a ele. – Eu te disse que lá tinha um esqueleto de Tyrantrum? ELE FICAVA NO CENTRO DO LUGAR E ERA ENORME!

    — AURORUS É MUITO MAIS LEGAL E MAIOR DO QUE AQUELE BICHO COM BRACINHOS! – Ayla logo se meteu no assunto.

    Oliver agradeceu pelo presente e o guardou cuidadosamente em um de seus bolsos enquanto as duas iniciavam uma discussão sobre qual o fóssil mais legal.


    O grupo logo começou a se mover. Ficariam a noite inteira ali dependendo delas mas Rafaella e Oliver concordavam nisso não ser uma boa ideia, mesmo que a discussão se mantivesse enquanto andavam. Kai e Ayla falavam agitadas sobre as coisas que viram no Museu, além de sobre como compraram aquelas roupas e como os fósseis em exibição eram legais.

    —...e então a Ayaya perguntou se dentro do âmbar ia ter um Beedril e... – por algum motivo que Oliver desconhecia Kai simplesmente passara a chamar Ayla de Ayaya. 

    Estavam tão animadas com sua conversa que não notaram quando Oliver deliberadamente reduzira o passo, ficando um pouco para trás, junto a Haru. Ela tinha um sorriso em seu rosto como se já esperasse o que viria em seguida.

    O jovem se aproximou mais, então falando baixo o suficiente para que apenas ela o ouvisse.

    — Temos um acordo. – foi o que saiu de sua boca.


    { 4 comentários... read them below or Comment }

    1. Haru melhor personagem, n importa se ela está tramando coisas maléficas, todo mundo erra nessa vida. Mds, o tempo todo não era a Kai que ia roubar uma pokedex, mas a Haru -o-, não só pra ela, mas para chantagear outra pessoa, que garota esperta.
      Oliver e Brendan quando alguém desafia: fodase. Queria saber o que aconteceu no passado e quem são essas pessoas que ele não quer encontrar e porque.
      KAI DE MOLETON DE DINOSSAURO É REAL E ESTÁ ME ALEGRANDO. Já shippo a Kai com tanta gente nessa fic q parece um harém, mas preciso de uma fanart tela com essa roupaaaa.
      Ótimo capítulo, Grovy! Logo lerei o próximo.

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      1. Oie Carol, tudo bom? <3

        A gente releva a chantagem da Haru pq é com o Oliver então tá suave hahahahahah
        Pobre Kai, todo mundo acusa ela de ser a ladra do rolê e esquecem dos outros que são piores

        Oliver e seus mistérios, mas essas pessoas logo aparecem, PRECISAMOS DE CONFLITO, DE TRETA.

        Kai com moletom de dinossauro é uma idéia que surgiu por conta de uma única imagem e eu pensei: “Ok preciso por isso na fic”

        Fico feliz que tenha gostado
        See Ya :)

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    2. AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA OLHA só quem voltou a ler. Otimo cap. Adorei os dialogos <3

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    3. Oiiiiiii Grovy

      Cá estou eu finalmente voltando a ler. Vamo que vamo. E sobre o capítulo, foi bem legal ver o ponto de vista do Oliver, você conseguiu criar um adolescente com 40 anos muito carismático. E a cada capítulo fico mais curioso quanto ao passado dele. O que será que aconteceu para ele parar nessa situação de só ficar viajando por aí no navio de um amigo da família? Pelo que parece, é algo relacionado a sua família, mas até o momento não tenho nenhuma teoria.

      Gostei de ambos personagens apresentados nesse capítulo, tanto o "rival" quanto o "tio" dele foram bem legais de seu próprio modo. Inclusive, é impressão minha ou o capitão se gamou na tia da Kai?

      E creio ser isso, até a vista, meu nobre confederado!

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