• domingo, 1 de agosto de 2021



    Encostado na varanda de sua cabine estava Oliver. O rapaz apoiava um dos braços na proteção enquanto em sua mão oposta uma xícara de café amargo era levada à boca e tomada a goles lentos enquanto pensava.

    Desde o dia anterior não vira sua nem tão requisitada hóspede, ela simplesmente sumira ao entardecer, mas como ela deixara suas coisas ele não se preocupou. Porém, ao acordar no dia seguinte o garoto notou que os pertences dela haviam desaparecido na calada da noite, e onde antes havia uma grande mochila e alguns papéis existia apenas uma pequena folha de papel meio amassada e de caligrafia apressada.

    ' Olá, ontem descobri que tenho uma doença gravíssima e me restam poucas horas de vida. Não quero que vocês chorem então decidi ir sem me despedir. Até nunca mais! '

    QUE TIPO DE IDIOTA ELA PENSA QUE EU SOU?! ”

    Ela se fora tão inesperadamente quanto surgira e ele obviamente revistou o cômodo, vendo se alguma de suas coisas haviam sumido, porém tudo estava em seu devido lugar, derrubado ou jogado pelos cantos como de costume.

    Agora tudo o que restava no quarto eram as coisas bagunçadas do jovem e uma estranha névoa que pairava no ar.

    Aquela névoa o incomodava. A cada gole em seu cafézinho ele reparava mais, não parecia ser natural, era como se a névoa tivesse início em seu quarto e formasse um caminho direto para a ilha que estava à frente dele.

    Ah, aquela ilha era definitivamente algo que não se vê todos os dias. Por um momento sua mente se distraiu do problema que tinha e pensou com seus botões que sua companheira de viagem gostaria do lugar.

    ...


    Kai estava agitada, mais do que sua agitação costumeira. Esse era o dia em que ela chegaria em Honey, a tão aguardada ilha e seu objetivo para estar viajando. Sua animação, porém, se dava por outro motivo. A jovem estava ansiosa para conhecer o local. Já vira fotos do lugar na escola e na internet, mas não era a mesma coisa, queria ver por seus próprios olhos. Qual o sentido, afinal, em viver pela ótica dos outros?


    Se esforçou para não ter algum “spoiler” do lugar pelas janelas até que conseguisse chegar ao deque superior, onde teria a melhor vista possível. Andou até a lateral que estava de frente para a ilha olhando para baixo, até que levantou a cabeça, e se pegou admirando boquiaberta a magnitude do local.

    Era bem maior que as últimas duas onde estivera, as construções em especial se mostravam imponentes comparadas as anteriores. Mas esse não era o ponto de destaque. A cereja do bolo, a parte mais chamativa, estava bem no centro da ilha.

    Uma gigantesca árvore se erguia imponente. Seu tronco era espesso, certamente deveria ter no mínimo um quilômetro de altura. Suas raízes eram como Serperiors que adentravam pelas ruas formando uma paisagem única, juntamente as casas que foram construídas não destruindo, mas se adaptando a planta que subia pelas paredes. Seus galhos eram como vigas que sustentavam a grande folhagem que exibia cheia de pompa e formava uma espécie de guarda chuva, como se protegesse aquele pequeno cantinho do universo das tempestades de mal que existiam por aí, a guardiã daquelas pessoas.

    Ao redor da ilha, em tamanho bem menor, era possível ver pequenos pontinhos amarelados entre a vegetação natural, alguns estáticos e outros aos quais podia jurar estarem se mexendo.

    A agitação anterior da garota fora dobrada, aquilo era muito melhor do que qualquer descrição que tivesse lido, era tudo tão... Incrível!

    ...


    Após algum tempo de viagem o navio ancorou no porto da cidade, era pequeno, menor do que se esperaria em uma cidade com tamanho potencial turístico, porém era simples e aconchegante. Algumas pessoas esperavam para desembarcar, todas pareciam bem calmas, quer dizer, quase todas. Uma garota jovem entre a meia dúzia de expectadores encontrava-se impaciente batendo seu pé no chão em um ritmo acelerado. Em seu ombro, um pequenino pássaro de coloração esverdeada repousava.

    Desembarcando juntos estavam Kai, Oliver, Rafaella e Ayla. Os quatro andavam devagar, não que tivessem escolha, já que não poderiam pular as pessoas em sua frente. Mas estavam tão lentos que algo chamara atenção do garoto. Mais abaixo, próximo a costa aquele rastro de névoa continuava, como se a névoa magicamente escolhesse não adentrar a ilha mas sim lhe circular, seguindo pela costa, quase um chamado para ir atrás.

    ESSE LUGAR É ENORME! ” disse Kai ao finalmente alcançar terra firme.

    Ayla e Oliver também não conseguiam disfarçar seu encantamento pelo local.

    Nem é pra tanto.” Rafaella falou um pouco atrás dela. A garota, diferente dos outros três, não parecia nada impressionada. Pelo contrário, parecia querer sair dali o mais rápido possível.

    COMO NÃO?! OLHA PRA'QUILO! ” exclamou Kai apontando com o indicador para a árvore, que se mostrava ainda maior vista de perto. “ EU QUERO IR LÁ! ”

    Rafaella estava prestes a continuar sua discussão quando uma voz feminina a interrompeu.

    MANINHA! ” após isso, uma garota pulou em direção a ela, lhe puxando para um abraço apertado. “ Que saudades! ”

    Ela era alta, e tinha seu cabelo bem mais curto que o da irmã, porém também espetado. Usava uma camisa verde de botão com um nó amarrado na cintura, na cabeça um laço vermelho. Em seu ombro curiosamente estava um Xatu, imóvel e sem piscar, mesmo com toda aquela movimentação.

    Tá bom, tá bom! ” a mais baixa tentava escapar do abraço sem muito sucesso.

    O resto do grupo parecia bem perdido com a aparição repentina. Na verdade, nenhum deles tinha sequer noção de que sua amiga tinha uma irmã, nem mesmo Ayla.

    Quem é você mesmo, 'hein' colega? ” a última perguntou, surpresa.

    Rafaella tentou começar a falar mas foi imediatamente interrompida.

    Eu me chamo Francesca, mas podem me chamar só de Fran. ” disse enquanto dava uma piscadinha. “ E vocês, quem são? ”

    Após uma breve apresentação do grupo ela parecia ainda mais contente.

    Amigos da Rafinha são meus amigos também, 'cês' querem conhecer o lugar? EU CONHEÇO OS MELHORES PONTOS! ”.

    Eu já disse pra não me chamar assim... E você não precisava ir em algum lugar? Eu posso te levar. ” Rafa perguntou olhando para Kai em uma última esperança de conseguir escapar daquela indesejável reunião de família.

    É mesmo, quase ia esquecendo! 'Pera ae'. ” abriu sua mochila e começou a procurar por algo. Em meio a algumas pokeballs e mudas de roupa ela encontrou um pedaço de papel, meio amassado e em um leve tom rosa. A caligrafia precisa e caprichada de sua tia era fácil de reconhecer, bem diferente de sua própria. “ Vocês conhecem um tal 'Sweet Queen'? ”

    Enquanto terminava de recitar as palavras a breve esperança nos olhos de Rafaella ia se esvaindo ao perceber onde ela precisaria ir. Fran, no entanto sorriu com a cena.

    Claro que conhecemos, essa loja é da nossa família! ”


    ...

    As ruas de Honey eram curiosas, para dizer o mínimo. Toda a cidade fora construída cercando a gigante árvore ao centro, portanto, as casas formavam um círculo que lentamente se elevava em altitude conforme se aproximava da zona central.

    As longas galhas, com sua folhagem abundante, traziam frescor a cidade, enquanto os raios de sol achavam seu caminho entre os ramos, sempre mantendo algum nível de calor, nunca em excesso, além de trazendo maior belez ao local.

    Kailani andava maravilhada pelo local, tudo era interessante demais para ela. Sejam as raízes que forçavam caminho entre o concreto, as belas flores amarelas que floresciam por toda a ilha, as folhas que caiam e forravam as ruas, os Combees que voavam agitados sobre as últimas, e uma estranha espécie de pokemon com chifres ao qual ela nunca vira andando tranquilamente pela cidade. Ela fazia questão de apontar sua pokédex para cada criatura que encontravam, atrasando aquilo que deveria ser rápido.

    No momento, apenas Kai, Rafa e Ayla andavam juntas. Oliver e Fran se separaram do grupo ainda no porto, o rapaz relatou precisar resolver algo na costa da ilha, oportunidade essa imediatamente aproveitada pela garota de cabelos espetados para empurrar a irmã para junto do outro sem a menor cerimônia, alegando que ele precisaria de um guia, ignorando qualquer tentativa do jovem de negar a companhia não requisitada.

    Conforme elas caminhavam encontravam alguns dos residentes. Todos eram amigáveis e se alegravam ao perceber a presença de Rafaella. Era curioso que em sua grande maioria eram pessoas com certa idade, havendo poucos jovens pelas ruas.

    Ei, Ayaya, você acha que ele tem dono? ” a garota de cabelos cinzentos perguntou em mais uma das paradas sem aviso. Estava próxima a uma árvore, agachada com as costas encurvadas para a frente, uma mão se apoiava nos joelhos e a outra usava um graveto para cutucar um preguiçoso Meowth que não parecia se importar o suficiente com a presença dela. Por alguma razão, um pequeno grupo de Cutieflys sobrevoava sua cabeça, mesmo que ela não notasse suas presenças.

    Tá sem coleira. ” constatou em resposta.

    Tomou aquilo como um sim trocando o objeto que segundos atrás era usado para cutucar o felino por uma das pokéballs de seu bolso, para então se aproximar lentamente.

    Ei pequenino, quer ser meu amigo? ” susurrou.

    O Meowth, até então tranquilo, percebendo a aproximação saltou de sua posição relaxada, rosnando e acertando a mão dela com um inesperado Scratch. O ataque surpresa a desequilibrou para trás, fazendo-a derrubar a esfera no chão e assustar as criaturinhas que a seguiam pela ilha. Ayla e Rafa ao perceberem o que aconteceu rapidamente se voltaram a ela, preocupadas.

    Ei, cê tá bem? ” a primeira perguntou, lhe ajudando a levantar. Kai meneou que sim.

    Rafaella parecia mais tensa e tomou sua mão com gentileza, analisando a marca dos três cortes, o sangue escorrendo lentamente por ela.

    Não parece profundo, cê vai ficar bem. ” aliviada, tirou da bolsa que carregava uma garrafinha térmica e a abriu sobre as marcas. A água gelada lhe deu um leve arrepio mas logo trouxe alívio a dor que sentida. “ Eu devia ter avisado, mas os pokemon daqui não são muito amigáveis com treinadores, por isso se você quiser capturar algum precisa atrair ele com alguma coisa, em especial com o mel local. ” ela falava com calma, enquanto lavava a ferida que já não sangrava mais. Parecia saber o que estava fazendo.

    Brigado. ” agradeceu, com uma voz de mosquito, quando a outra terminou. Olhou para onde o felino estivera confirmando que ele se fora. “Acho melhor a gente ir andando.”

    O caminho que seguiram as levaram até uma rua bem próxima ao local onde estariam as raízes da árvore, entretanto estas não podiam ser vistas pois ao redor da "estrela" do lugar outras árvores comuns a rodeavam, bloqueando qualquer visão.

    Bem... Chegamos. ” Rafaella disse enquanto apontava para a loja em sua frente.

    O estabelecimento era grande. Possuia duas portas de carvalho escuro no centro e vidraças aos lados exibindo potes de mel em variados tamanhos e embalagens. Mais acima as palavras “Sweet Queen” foram escritas em tinta amarela de modo que a fazia parecer estar quase pingando, simulando seu principal produto.

    Kai parou na porta e respirou fundo, sua "mini jornada" estava chegando ao fim. Após entrar e cumprir seu objetivo ela poderia voltar para casa, voltar a sua monótona rotina em sua pacata ilha. Os últimos dias foram divertidos, mas ela sabia que esse momento chegaria.

    Sabe, acho que vocês duas podem entrar sem mim, eu espero aqu... ” Rafaella começou a falar quase no mesmo instante em que Kai avançou para dentro. “ E ela já foi. ”

    Ô DE CASA! ” empurrou a porta, que se abriu atingindo um sininho, que tilintando ajudava a avisar sua chegada aos donos do lugar, não que isso fosse necessário depois da gritaria.

    A loja mantinha em seu interior o mesmo aspecto visto do lado de fora, com as estantes e o balcão sendo de madeira espessa. Este último, como de praxe, separava a área dos clientes do espaço do caixa. Num canto mais escondido, curiosamente, alguns pinceis, baldes e potes se localizavam.

    De uma porta no fundo com alguns panos impedindo a visão, uma senhora saiu parando atrás do balcão. Era baixinha e usava roupas simples de manga longa manchadas com liquido amarelado, suor pingava por sua face. Encarou as três. Uma expressão confusa surgiu em seu rosto ao perceber determinada presença inesperada, e assim rapidamente virou o rosto após encarar Rafa. Kai não sabia dizer se ela estava irritada ou apenas surpresa.

    Dia, querem algo? ” a dona perguntou sem a cortesia geralmente esperada para com os fregueses. Não olhava diretamente para elas, e aparentava mexer em algo no balcão.

    Ayla, percebendo que as duas garotas em sua frente não tomariam iniciativa nenhuma tomou a dianteira. Encostou a palma de sua mão nas costas de Kai, lhe causando um leve arrepio e com um empurrão a impulsionou na direção do balcão.

    Fala tu. ” cochichou durante o processo.

    A pobre garota nem teve tempo de reclamar com ela, rapidamente se recompôs do susto e começou a falar.

    Opa, err... Eu quero mel, vim comprar mel. ” disse meio nervosa.

    Normalmente ela era falante e se dava bem com pessoas, mas o clima ali era estranho, não era necessário ser a pessoa mais observadora do mundo para notar as semelhanças entre a senhora e a amiga para deduzir serem mãe e filha.

    Nunca imaginaria que você pediria isso. ” a tal "mãe" revirou os olhos.

    Caminhou até os fundos da loja e não tardou em voltar carregando um pequeno pote de plástico com tampa avermelhada, esta marcada com as iniciais da loja e algumas informações menores, tabeladas. O líquido amarelo quase transbordava no frasco.

    Aqui está. ”

    Kai encarou o frasco com alguma decepção. Era óbvio que não seria o suficiente para suprir o estoque que precisava.

    Acho que tivemos um engano... ” tentou começar a falar até ser interrompida.

    Engano? Isso é mel. ” disse abrindo o pote mostrando o interior. “ Você pega e passa em uma árvore. É oferecido no pote, não tem como errar. ”

    Então, é que na verdade não é bem isso que... ”

    Ah, claro, esses jovens sempre sabem o que é certo né, agora querem ensinar pra mim o que é e não é mel. ” resmungou encarando as três.

    Subitamente, pela primeira vez desde que entraram no local, Rafaella abriu a boca.

    Mãe, nós não fizemos nada, não precisa tratar mal elas. ” falou sem a encarar nos olhos.

    Agora ela LEMBRA QUE TEM MÃE! ” seu tom subia a cada palavra, fogo no olhar.

    POR QUE É TÃO DIFÍCIL ENTENDER QUE EU NÃO QUERER ASSUMIR A DROGA DESSA LOJA NÃO SIGNIFICA QUE EU QUERO CORTAR RELAÇÕES COM VOCÊS?! ” a filha agora também gritava.

    Kai e Ayla não sabiam o que fazer com a discussão que iniciara. Deveriam levar a amiga dali? Se intrometer talvez atrapalharia ainda mais o que já estava ruim.

    Que confusão é essa na hora do meu cházinho? ” outra pessoa surgira da área dos funcionários, desta vez um homem.

    Baixinho e meio barrigudo, usava uma camisa social simples com suspensórios por cima. Em seu rosto o bigode bem cuidado já dava sinais da idade com alguns bons fios brancos. Na cabeça uma boina preta era vista escondendo os sinais da calvície.

    Ele olhou para a esposa e para as visitas inesperadas, rapidamente abrindo um largo sorriso ao ver quem estava entre os visitantes. Sua filha estava de volta ao lar.

    ...

    Oliver e Francesca caminhavam há algum tempo. Haviam se separado do grupo e seguido pela costa da ilha, circulando próximo ao mar. No ombro do garoto Axew tentava fazer contato com o Natu no ombro da companheira, porém sem nenhum sucesso. O rapaz estava meio incomodado com a presença indesejada, já ela não parecia perceber, ou caso percebesse apenas não se importava, e seguia tagalerando sem parar pelo caminho sobre informações aleatórias da ilha ou de sua vida pessoal.

    ... E ali foi onde eu cai de uma árvore e quebrei o braço... Eu brincava aqui perto com...”

    Ele não entendia muito bem o motivo de tudo aquilo. Como as pessoas conseguiam simplesmente encontrar desconhecidos e sair abertamente falando de sua vida sem mais nem menos?

    Ei... Você não acha que seguir pessoas desconhecidas pro meio do mato pode ser meio perigoso? Sabe como é, você me conheceu não faz nem meia hora. ” ele disse, quebrando seu ritmo de acenos de cabeça e ocasionais "Aham".

    Ela, que andava um pouco mais a frente, virou, meio confusa.

    Eu confio nas decisões da Rafinha. Se você é amigo dela deve ser uma boa pessoa. Além disso eu tenho bons palpites sobre as pessoas.” disse sorrindo enquanto se virava. “ E você também é meio bonitinho, que culpa tenho? ”

    Se ela tivesse mantido seus olhos nele poderia visto o rapaz corando levemente, desviando o rosto para o chão. O que ela também não viu foi o momento em que o Xatu em seu ombro girou cento e oitenta graus e encarou o moreno com aqueles grandes olhos, emitindo uma luz vermelha em uma ameaça silenciosa.

    Assustador. ” murmurou Oliver, tremendo por um instante.

    Os dois seguiram seu rumo por mais alguns minutos. A brisa leve do mar era agradável e a conversa agora era menos unilateral, ainda que ele seguisse monossilábico.

    Quando se deram conta haviam alcançado um ponto peculiar; uma pequena porção mais baixa do que aquela da qual vieram, onde não havia mais casas e que possuía areia. A parte que chamava atenção no entanto era a névoa que ele seguira até ali, pois ela parava abruptamente, como se por vontade própria ela tivesse se originado no quarto dele e viajado até aquele ponto.

    Francesca avançou primeiro. Pisando na areia, chutou um pouco pro alto e olhou em volta. Haviam marcas ali.

    Isso aqui é estranho. ” comentou Fran enquanto olhava para o formato do que fora marcado. Era grande, o que quer que fosse saiu do mar e se arrastou por ali, até que subitamente desapareceu sem deixar rastros, e então uma nova dupla de marcações surgiam mais a frente, algo que indicava um par de botas junto de quatro grandes pegadas animalescas, parecendo seguir floresta a dentro, enquanto começavam a desaparecer devido a ação do vesto sobre a areia.

    Oliver, que estava mais atento ao nevoeiro do que aos pequeninos grãos arenosos, olhou para onde ela falava percebendo duas coisas. A primeira era que ela andava descalça e como não havia chinelo por perto ele assumiu que estivera assim desde que se encontraram. Já a segunda foram as marcas. As tateou no chão como um dia vira em um filme de detetive, não que realmente conseguisse tirar alguma informação além do óbvio ali, e não que isso fosse eficiente numa praia de areia, mas ele não tinha como saber disso.

    Como pensei, com certeza é ela. ” Oliver comentou, com uma certeza absurda e infundada, tendo como base talvez apenas seus instintos.

    Ela...quem? ” a outra questionou.

    Logo se lembrou que não contara a ela o motivo de estar ali, rapidamente tentando explicar da maneira mais reduzida que podia.

    Eu tô seguindo essa garota e...”

    Pera aí, seguindo? VOCÉ É UM DAQUELES STALKERS!? ” perguntou se distanciando. “ Stalker! Nojento! Inimigo das mulheres! ” disparou.

    Ei, calma aí, não é assim também! Eu só não pensei muito antes de falar! ” o jovem logo tratou de explicar a história direito para a outra, esta ainda meio desconfiada, apenas omitindo um ou outro ponto dos quais ele se envergonhava de lembrar.

    Ela analisou a história, parecendo se convencer.

    Deixa eu ver se entendi... Tu ajudou uma mina estranha a embarcar em um navio de luxo e agora ela sumiu e você acha que pode ter roubado algo? E você ainda quer dar uma de sábio me dizer que eu confio fácil pessoas! ” disse sem conseguir conter uma risadinha.

    Falando assim em voz alta você me faz parecer um idiota... ” balbuciou concordando com um aceno de cabeça contrariado.

    Não disse isso, mas você também não é muito esperto. ” ela retrucou ainda sorrindo.

    Ei, não precisa zombar! Na real eu nem pedi pra você me acompanhar! Você pode sair daqui quando quiser. ” estava começando a se irritar, mesmo que soubesse que não havia causa pra tal.

    Não tô reclamando. Você é engraçado, e eu não tenho nada melhor pra fazer. Conhecendo mamãe a essa hora ela deve estar brigando com a Rafinha, sabe? Ver isso seria um saco. ” respondeu com calma. “ Falando sério agora, por que você não falou com alguém? Cê nem precisava fazer isso, quem dirá sozinho. Talvez ela só tenha os motivos dela pra ir embora, nada demais. ”

    O que ela falava fazia sentido, por que ele não pediu ajuda pra alguém? Kai? John? Talvez até mesmo Ayla e Rafaella. Todos poderiam ter ajudado. Ainda assim, ele continuava tentando fazer tudo sozinho. Parecia estar tentando provar que poderia ser forte, e que se seguisse Haru para sabe-se lá onde e descobrisse que na verdade ela não era quem pensavam ser que ele poderia se orgulhar de estar certo sobre algo uma vez em sua vida.

    Acho que você tem razão, a gente devia... ” começou, mas logo sua voz fora suprimida por um som muito mais alto.

    KIARA, EU JÁ FALEI QUE VOCÊ NÃO PODE CONTINUAR ARRANJANDO BRIGA COM ESSES MEOWTH! SE VOCÊ MORDER O PESCOÇO DELES ELES MORREM! ” uma voz conhecida por ele foi ouvida gritando mais ao longe, mas ainda era mais baixa do que uns grunhidos tristes que puderam ser ouvidos em sequência. “ E NÃO ADIANTA FAZER ESSA CARA DE ARCANINE QUE PERDEU O OSSO PRA CIMA DE MIM NÃO! ”

    Fran olhou para o garoto, como se perguntasse se aquela voz pertencia a pessoa que seguiam.

    É ela! Vem comigo. ” e correu na direção do som.

    ...

    O barulho da água preenchendo as xícaras era um breve acalento após a confusão que ocorrera minutos atrás. Na verdade, o clima ainda estava meio estranho. O trio estava sentado na sala de estar da casa de Rafaella. Ayla e Kai dividiam um sofá pequeno de cor bege, estando sentadas lado a lado e de frente à televisão. Rafaella estava em uma poltrona cinza, sozinha, rumo a uma cadeira de balanço vazia. No centro da sala havia uma mesinha de vidro baixa com um daqueles panos feitos de crochê, e sobre ela um jogo de xícaras branco com detalhes pintados a mão estava disposto. Próximo a ele um jornal da “Folha do Arquipélago” era visível, com as manchetes disputando a atenção de quem as visse com letras garrafais.

    ' ASSALTO AO MUSEU DE CAVE... OS PERIGOS DA CARNE DE MAGIKARP PARA A PELE...CRESCENTE NÚMERO DE SAQUES EM NAVIOS... INAUGURAÇÃO DA PRIMEIRA SAFARI ZONE EM DECOLORE... COMO APARAR O SEU BONSLY...', nada que atraísse interesse suficiente de uma das presentes para ler as matérias.

    No chão, Tomy, o Rotom, junto do Shinx de Rafaella, brincavam com um grande Luxray que parecia confuso com a presença do fantasma.

    Um cházinho sempre ajuda a acalmar depois de um dia difícil. ” disse o velho de Rafa saindo da cozinha e servindo a filha e as convidadas com um pouco da substância.

    Pai ainda não passou do meia dia. ”

    Oh! É verdade. ” disse enquanto se sentava na cadeira de balanço, soltando um longo suspiro. “Considerem isso meu pedido de desculpas pela minha esposa. As vezes ela se altera um pouco, mas é uma mulher adorável! ”

    Das muitas palavras que Kai poderia descrever a mulher que mal conhecera, "adorável" não seria uma das primeiras escolhas, mas dizer tais palavras sobre a mãe de uma amiga não parecia ser a melhor das idéias, então se contentou em agradecer.

    Tá tudo bem, senhor? ” perguntou, no lugar de seus questionamentos internos.

    Fiore. ” respondeu ele, enquanto tomava um gole de seu chá. “ Mas então, o que motiva a visita de minha filha em fuga? ” tentava fazer uma voz mais séria, embora não conseguisse disfarçar uma risada de canto.

    Kai olhou para o senhor, em seguida olhou para Rafaella, repetindo o processo mais uma vez até virar para Ayla, que não parecia surpresa.

    VOCÊ FUGIU DE CASA?! ” enfim explodiu, na direção da filha dos donos.

    SHHHH, fala baixo! " deu um esbravejo sussurrado. " Já foi um milagre o papai ter conseguido acalmar ela e deixar a gente passar a noite aqui! Vai que ela escuta!” a preocupação de Rafaella era bem justificada, afinal, a casa de sua família ficava de frente a loja. “ E eu não fugi de casa, eu só sai sem avisar. ” desviando o olhar.

    Kai estava surpresa. Esperaria algo assim de Oliver ou Ayla, não dela. Estava ainda mais chocada com a tranquilidade que o Sr. Fiore lidava com o assunto.

    Ele, percebendo a confusão, olhou para os lados e para a janela de vidro em direção a loja do outro lado da rua. Após confirmar algo, apoiou o corpo em algo e o esticou para a frente, colocando a mão livre na lateral da boca como uma criança que está prestes a contar um segredo.

    Eu ajudei ela a sair. Mas não contem pra minha Sandrinha, ela me mata se souber! ” se ajeitou na cadeira, retomando a xícara e a levando a altura do rosto enquanto soprava, agora aparentando mais seriedade. “ Eu acredito que os jovens precisam ser livres para correrem atrás de seus sonhos. Que tipo de pai eu seria ao ver minha filha infeliz por meu egoísmo? ” com um suspiro.

    Rafaella sorriu meio encabulada enquanto Kai o observava curiosa. Nunca conhecera seu pai. Neste momento se perguntou como sua vida teria sido se estivesse presente. Será que ele acreditaria nela como aquele homem acreditava na filha? Perguntas como essa eram algumas das quais ela nunca teria resposta.

    Alguns bons minutos se seguiram ali enquanto conversavam. Pai e filha colocavam o assunto em dia, principalmente sobre as coisas que ela vira junto com Ayla, até que em algum momento o assunto chegou em como conheceram Kai, o que inevitavelmente levou ao motivo de estarem ali.

    " Compreendo... Eu gostaria de poder ajudar, mas veja bem, nós separamos aqui nossos mels em duas categorias, sendo elas os mels de consumo e os mels ferômonizados. O segundo é o que mais vendemos, por ser mais procurado e não ser um mel puro. Basicamente é um mel no qual se mistura própolis, alcool e alguns feromônios para gerar um olor atrativo para pokémons, e isso gera uma procura incrível entre treinadores, além de ser barato de produzir e exigir menores quantidades de mel puro. O mel de consumo, no entanto, já é o mel puro, que varia em umidade, sabor e textura acordo à espécie produtora e a florada da época, então precisa da quantidade integral do mel para poder ser vendido assim, o que para nós não está sendo interessante visto alguns problemas no período produtivo recente. Por causa disso, não temos estoque dele. " fez a longa explicação, enquanto tomava gole a gole o seu chá até este acabar.

    A decepção no rosto de Kai era nítida.

    E quanto tempo vai demorar pra ter no estoque? ”

    O homem balança a cabeça, como em negação.

    " Nós não temos previsão, Estamos abastecidos com a produção de Beedrills e Ribombees, mas elas não produzem grandes quantidades de mel. As Combees, que produzem a maior parte do mel que sai daqui, estão muito ariscas, e não permitem aproximação nem à matriz nem as colônias, que ficam na Grande Árvore Antiga e nos seus arredores. Cá entre nós, tudo indica o nascimento de uma nova Vespiqueen, e isso deve estar causando conflito entre as Vespiqueens de ambas matriz e colônias. Se aproximar numa situação dessas é muito perigoso, e alguém da minha idade não aguenta mais essas aventuras, então só podemos esperar que tudo se resolva. " então se levanta e leva as xícaras para a cozinha.

    É uma pena, mas quem sabe se a gente esperar até o navio partir elas já pararam o conflito? Talvez assim ainda dê pra conseguirmos algum mel delas. ” Ayla tentou a consolar. “ E no mais, qualquer coisa você pode tentar convencer eles a te venderem e levar mel das Ribombees e Beedrills, são muito bons também. ” Rafa completou.

    Alguns segundos passaram com a garota em silêncio, se esforçando para desviar da conclusão que lhe parecia óbvia. Levantou do sofá cheia de determinação.

    Eu só preciso ir nessa árvore sei lá o quê e trazer uma das Vespiqueen, né? ” perguntou decidida.

    Qual parte de ser perigoso você não ouviu? ” Ayla questionou. “ E de ser só um palpite? ”

    Eu sei me virar, e além do mais, eu tenho isso comigo. ” a tranquilizou enquanto puxava o celular do bolso, o levantando com um braço. Imediatamente o Rotom flutuou ao seu encontro, possuindo o aparelho e então pairando entre elas.

    Vamos Tomy, hoje a gente vai pegar uma rainha! ”


    { 3 comentários... read them below or Comment }

    1. Oiii Grovy!

      A jornada da Kai parece estar chegando ao fim. Apesar disso, ainda temos muita coisa para desenvolver. Por falar nisso, gostei do aprofundamento que você deu para a Rafaela.
      E essa neblina aí? Eu não consegui pensar em nada para explicar ela e parece que o Oliver é o único que vê, se não me engano. E temos a Haru também. As informações no jornal nos informa sobre roubos em navios e isso imediatamente me remete a ruiva. Eu realmente acho que ela está envolvida de alguma forma, mas espero que não seja a responsável. Vamos ver o que você nos preparou.
      E é isso, Grovy, a história está muito boa e estou muito curioso para saber que rumo ela vai tomar.

      Até o próximo capítulo!

      ResponderExcluir
      Respostas
      1. Obrigado pelo comentário Alefo, fico feliz em saber que você está lendo a fic do grovy.

        Excluir
    2. Não sei bem o que me levou hoje para vir até aqui, mas acho que a minha sanidade mental foi curada ao ver este bando de gente louca em loja de mel e aos berros no meio da rua. Adorei o Capitulo e dei umas boas risadas! Admito que os Capítulos anteriores eu li à muito tempo, mas voltar aqui avivou-me bem memória, e eu pensava que estava atrasada em mais Capítulos kk

      CONTINUE ESCREVENDO ESTA HISTÓRIA INCRIVEL.

      ResponderExcluir

  • Copyright © - Nisekoi - All Right Reserved

    Neo Pokémon Decolore Powered by Blogger - Designed by Johanes Djogan